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FIFTY SHADES OF VANESSA PAQUETE

FIFTY SHADES OF VANESSA PAQUETE

TIAGO MADALENA ( VI INTERVIEW ABOUT HIM - THAT BOY SHOUD BE MINE )

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Passou-se um mês até conseguir uma VI entrevista com a Vanessa. Para trás ainda se encontravam todas as nossas conversas feitas presencialmente em Setúbal, conversas essas que, muito preguiçosamente, ela nem pegou. Pareceu-me que o progresso nas transcrições das mesmas estava a ser um processo moroso e algo complicado para ela, ou tão simplesmente, Vanessa arranjara tal como desculpa, pois evadia-se do assunto sempre que eu o focava. A sua ausência confidencial na rede cibernauta que costuma utilizar também me levou a crer que algo se havia transformado nela; de uma Vanessa intimista e sempre pronta a dinamitar o mundo, passamos a ver uma Vanessa muito mais recatada, silenciosa, pouquíssimo focada no seu passado ou nos seus males presentes e mais direcionada para dar-nos alguns bons singles de música ou exibir o seu trabalho enquanto fotógrafa e jornalista/escritora! Dado o contexto da nossa última conversa, e por aquilo que já havia percecionado no próprio Blog, havia algo relativamente as nossas conversas acerca do Tiago que a maçava francamente, como se já não dispusesse de tempo ou paciência sequer para as encetar, por isso, foi com grande espanto meu que rececionei um telefonema seu espontâneo, a comunicar-me que estava pronta para a próxima entrevista. Tinha acabado de fazer um Evento e planeava ficar parada durante umas semanas, e estava disponível para entrar numa série de telefonemas regulares comigo. A nossa conversa, propriamente dita, teve lugar só duas semanas depois desse seu inesperado telefonema. A sua voz soava como um sussurro, como uma espécie de cântico subaquático de tão letárgica que era. Como sempre – na Vanessa – tudo é imprevisível; acabamos a falar de tudo e mais alguma coisa, desde relacionamentos, a Tiago Madalena, futebol e Avenida Brasil (risos).

 

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Helena: Eu ando verdadeiramente impressionada contigo; andas silenciada, titubeante…Sinto um nervosismo amiúde na tua voz. Já me disseste, por diversas vezes, que confidenciar-me os teus sentimentos é um ato de fé e de redenção para com o teu passado, uma espécie de pacto de honra para com a Vanessa que amou incondicionalmente o Tiago – ou o fantasiou – se assim preferires, durante anos; tudo isto é em nome dessa Vanessa?

 

Vanessa: (a sua voz entristece) Indubitavelmente: ela merece-o! A pessoa que eu fui no meu passado pelo Tiago (cada vez me convenço mais disso) necessita de um prémio de consolação. Uma pessoa não desperdiça 22 anos da sua vida, planifica uma existência inteira, abdica de casamentos, infere em riscos, modifica cada mínimo detalhe da sua vida (ou tenta pelo menos modifica-lo) desde a sua fisionomia até a sua psique e condição monetária e fica no limbo. Eu não sou essa pessoa! (está zangada e de péssimo humor)

 

Helena: Vejo-te mais ferida no orgulho de que no coração; será possível?

 

Vanessa: Sim e não! Presentemente, eu tenho aquela clarividente e perfeita consciência da minha paixão incondicional e avassaladora pelo Tiago, uma paixão tão forte e dedicada que – a exceção de fazê-lo contigo – não desejarei ouvir o seu nome ou ver a sua cara nos anos vindouros e rezo a Deus para que tal aconteça. Os meus sentimentos para com ele, presentemente, são tão cordiais quanto imparciais! Existe um pedaço de mim que o crucifica numa cruz e a culpa de tudo (suspira) e existe outra metade de mim que o iliba do purgatório, ao qual, o condeno tão frequentemente e clarifica tudo na minha cabeça e dardeja-me com racionalidade, bom senso e lucidez. Essa parte de mim é revestida de pura sensatez e impele-me a ser cordial e imparcial.

 

Helena: Estás com um tom de voz constrito; estás bem? (a sua seriedade de voz começa a preocupar-me, não parece que esteja com um humor favorável a uma conversação acerca do Tiago, parece-me claramente mal-humorada) Queres que paremos? Podemos deixar a conversa para outro dia, se quiseres!

 

Vanessa: Não, não… Não te preocupes! Podemos continuar!

 

Helena: Hmm…Queria direcionar esta entrevista para um campo mais direto, conciso, incisivo e intimista. Questão, resposta direta e curta!

 

Vanessa: (ri-se) … Como uma espécie de “Verdade Ou Consequência”?

 

Helena: Se assim o entenderes. Será uma entrevista, quiçá, mais encurtada e sucinta mas, em simultâneo, esclarecedora em determinados aspetos, e muito enigmática noutros!

 

Vanessa: (risos interrompendo-me) Tu queres ver-me a ser linchada em Leça?

 

Helena: Então estás a sugerir que…

 

Vanessa: (ri copiosamente) Oh Helena, queres ver-me a arder num auto-de-fé? É exatamente isso que estou a sugerir.

 

Helena: Tens de ser sempre tão dramática?

 

Vanessa: (suspira e fica pensativa).Tenho! Faz parte da minha personalidade, mas, na realidade apenas te disse aquilo em que acredito. Se quiseres ver-me a arder num auto-de-fé, ao invés, de passares os próximos meses numa cavaqueira acesa comigo podes prosseguir…

 

Helena: Ok, para começar, tens qualquer medo ou receio daquilo que publicas neste Blog?

 

Vanessa: (a sua voz mostra-se cautelosa) Queres mesmo que te diga a verdade? Sim, tenho bastante receio! Do outro lado sempre recebi e hei-de receber um silêncio gélido capaz de tornar o fogo frio e não importa se quem partilha a sua cama é a Joana, a Mariana ou a Diana. Aos onze anos de idade eu já me encontrava aqui. Ele já estava a minha frente. Todas as outras chegaram depois. “ Peço desculpa e com licença mas afastem-se dele que o primeiro lugar da fila pertence-me a mim! “ Isto foi o que sempre me apeteceu gritar-lhes desde o início mas é um pouco louco e presunçoso, não? Aliás, absolutamente insano! Mas estou a ser-te tão sincera neste momento que nem imaginas, sempre me apeteceu gritar isto alto e bom som, porém, o tal bom senso, a lucidez, aquele lado chato e racional que existe em nós, nunca me permitiu andar a fazer tal coisa. Fiquei destroçada. Frustrada. Zangada. De coração partido. De rastos. Num tumulto inatingível e ruidoso. Nunca interferi em nada. Concedi-lhe carta-branca e um total livre arbítrio para viver a sua vida: que mais podia eu fazer? Exclamar que ele me pertencia por direito porque eu o vira primeiro e decidira, muito antes que qualquer outra pessoa, devotar-lhe a minha vida? Isso não teria qualquer lógica! E parecia algo louco, não? Para ser-te sincera – e num ato de genuína insanidade e ebriedade - eu gostaria muito de ter exclamado numa voz furiosa, que nem um Quos Ego, “ Hey, este homem é meu compreendido? Eu vi e percecionei a mulher que ele desejava do seu lado quando ele tinha apenas quinze anos de idade, ok? E por onde andavam vocês nessa altura? Muito provavelmente a brincar com Barbies e Kens! Deixem o lugar a quem de seu devido respeito ele pertence! “

 

Helena: (risos compulsivos) Eu pedi-te para seres franca, mas, o tom da tua voz está tão zangado… Sinto que o que estás a dizer te sai mesmo das entranhas. Quase consigo ver-te a franzir o sobrolho do outro lado da linha e armada até os dentes… E perdoa a minha ignorância mas tu querias gritar-lhes o quê que nem um quem? (rio-me…não faço a mínima ideia o que será um Quos Ego)

 

Vanessa: Oh Céus; o que fui eu dizer? Não se pode apagar o último parágrafo? Acho que me excedi um pouco.

 

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Helena: (A Vanessa soa-me deveras preocupada mas eu não consigo parar de rir, quase que a imaginei na minha cabeça como a personagem da nossa infância – a Mafaldinha – de punho erguido e colérica a gritar com indignação contra o facto de o Tiago não ser seu e, por mais que eu tentasse, não conseguia dissipar aquela imagem da minha cabeça) Desculpa, a sério, só que ocorreu-me algo a cabeça e acabei por desfazer-me em risos. Não queria de maneira alguma ferir a tua susceptiblidade. Desculpa – exclamei – mas é que gritaste-me de uma maneira tão furiosa que parecia que um arpão me ia trespassar do outro lado da linha…

 

Vanessa: Por isso mesmo te peço para apagares aquele parágrafo (a sua voz soa a uma súplica)

 

Sendo a Vanessa a transcritora – por natureza – e a avaliadora oficial de todas as conversas que encetamos, evidentemente que tudo o que ela ache impróprio pode ser apagado, todavia, logo no inicio destas entrevistas houve uma espécie de pacto entre nós: a sinceridade seria o nosso cunho de marca. Nem eu, nem ela, pretendíamos andar para aqui a encenar conversas ciciadas só para toda a gente figurar bem na cartilha. Ela ter-me-ia de dizer a verdade. Ser honesta para comigo e, acima de tudo, honesta para consigo própria, portanto, o paragrafo ficou, pois ela disse-o com a mais férrea das convicções e respeitou o meu pedido de transparência absoluta, ainda que em pânico.

 

Helena Coelho: Ainda não me explicaste. O que é um Quos Ego?

 

Vanessa Paquete: (responde-me com um ar maçador e, nota-se, bastante chateada) Quos Ego é uma forma de expressão; é com estas palavras que Neptuno dirige a sua ameaça aos ventos desencadeados sobre o mar; satisfeita?

 

Helena Coelho: Sim. Diz-me uma coisa: lidas bem com a rejeição? Tiveste resmas de namorados. A tua pacificação com o teu passado em relação a eles é assoberbante; as tuas relações passadas não te causaram mágoa, dor, saudosismo? O Duarte abandonou-te após sete anos de namoro a porta do Tiago; não sofreste? Tu pareces a Santa Rita de Cácia com todos os teus ex-namorados: perdoa-lhes todos e quaisquer percalços, coloca-los num pedestal, exacerbas e vês sempre o lado maravilhoso deles, deseja-lhes paz, amor e felicidade e nunca se escuta uma palavra maldizente vinda da tua boca acerca deles ou das mulheres que os arrebataram. É incompreensível.

 

Vanessa Paquete: Tens razão (sorri). Adoro os meus ex-namorados. Não te vou negar que existiram discussões, percalços no meio do caminho e até desfechos mais agressivos que também sempre perdoei. As primeiras horas e os primeiros três meses eram de uma dor acutilante e desesperante. Muitas lágrimas rolaram por outros homens. Recordo-me de cada abandono; dos meus olhos verdes cor de topázio (ficam dessa cor quando choro) ficarem enxagues, duros e absolutamente incapacitados de se abrirem perante a luminosidade devido ao choro compulsivo.

 

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Helena Coelho: E como é que ultrapassavas isso?

 

Vanessa Paquete: Acontecia um milagre (ri-se). O chamado milagre do santíssimo “ Tiago Madalena “. Um dia amanhecia, o ácido venenoso e corrosivo havia desaparecido das minhas veias, o meu corpo entorpecido ganhava forças, o meu rosto vestia uma máscara de serenidade, levantava-me vagarosamente e ia percorrer as fotografias do meu ex-amado com os dedos. Ao fazê-lo, por mera coincidência do destino, ou seja lá o que for que se acredite, ao arrumar a caixa ou envelope num sítio qualquer caia-me aos pés uma fotografia do Tiago. Estranha e assustadoramente era sempre a mesma. Os meus joelhos começavam a tremer, o sangue começava a correr muito mais depressa do que o normal nas minhas veias. Eu contemplava a fotografia com um ar distante até que a apanhava. Depunha-a sobre a cama e era como se esperasse uma resposta, uma solução, algo… A partir daquele momento toda a dor desaparecia do meu peito. O amor que eu havia vivido tornava-se numa doce recordação. As más recordações em farrapos de nuvem perdidos no céu que eu não tinha o mínimo interesse de manter junto a mim. A alforria do meu coração escravizado por aquele amor que me havia magoado era assinada. A vida passava a ganhar sentido outra vez: eu voltara para o meu antigo amo e senhor, o Tiago! Ao longo da minha vida eu tropecei muitas vezes e apeteceu-me-verdadeiramente- torcer o pescoço a algumas pessoas, mas, o Tiago salvou mais pessoas do que ele alguma vez na vida possa imaginar. O meu apego a ele fez com que todos os outros ex-namorados seguissem com as suas vidas, se cassassem, tivessem filhos e não tivessem de levar com um furacão de nome “ Vanessa “. Tenho um grande apreço por todas as relações que encetei. Guardo-os na minha memória com um grande carinho e só posso elevar e agradecer o facto de me terem concedido uma oportunidade de compartilhar a minha vida com eles. Deram-me momentos extraordinários (todos, cada qual a sua maneira) e adoro-os! Não possuo qualquer mágoa, rancor, inveja ou ciúme, apenas uma grande sensação de conforto e felicidade por os ter tido na minha vida e por os ter podido amar e por ter sido amada por eles.

 

Helena Coelho: Isso é que é algo desconcertante! Tu não sentes nada relativamente a uma centena de pessoas que passaram na tua vida…

 

Vanessa Paquete: Sinto que foram estórias que aconteceram, foram vivenciadas por mim e tiveram o seu término. Vejo por aí muitas mulheres e homens a sofrerem após um ano ou dois de um relacionamento ter terminado e – por muito que me esforce – não consigo interiorizar as suas dores porque nunca vivi nada do gênero. Recentemente, algumas pessoas procuraram-me devido aos textos escritos para o Tiago. Pensaram que poderiam compartilhar comigo a sua estória e que eu poderia consola-las ou dar-lhes algum conselho – ou em última instância – dizer-lhes como se ultrapassa o saudosismo, a falta da pele, o maldito latejar das feridas. Fiquei confusa, confesso-te! Tive de lhes explicar mais intimamente o que havia acontecido entre mim e o Tiago para que compreendessem que não existiam quaisquer paralelismos nas nossas estórias e que – na realidade – eu não podia ajuda-las em absolutamente nada do que estavam a sentir, tendo em conta que só se sente falta daquilo que se possuiu!

 

Helena Coelho: (sorrio perante a sua honestidade) Uma das qualidades que sempre mais apreciei em ti foi a tua sinceridade, sabes? A maneira como te revelas e sem quaisquer vírgulas ou parêntesis a mais, contas a tua estória de amor impossível pelo Tiago e não lhe acrescentas contos e ditos, embora eu saiba que, do fundo da tua alma, tivesses desejado acrescentar-lhe reticências…

 

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Vanessa Paquete: Sim, é uma verdade irrefutável! Nunca ninguém o conseguiu substituir no meu coração ou ocupar o seu lugar. De cada vez que empreendia uma relação vivia sempre uma vida dupla, algo em que me tornei exímia: amar em paralelo, fazer sexo em paralelo, sincronizar os meus lábios com os de outra boca quando, muitas das vezes, os meus neurotransmissores estavam absolutamente sintonizados nos lábios dele. Aconteceu-me tantas vezes adormecer numa outra cama a tê-lo na minha cabeça como último pensamento que lhes perdi a conta. No final, acaba por se tornar um hábito! Resignamo-nos à vida. Acostumamo-nos a que a existência seja assim.

 

 

Helena Coelho: Não é algo constrangedor e sinistro? Não te sentias aprisionada?

 

Vanessa Paquete: (dá uma pequena risada) Sim, posso confessar-te que tive muita sorte com os homens que encontrei, as estórias que empreendi e a maneira como as encaminhei! Para começar, sempre preservei a minha independência daí que esteja na miséria (ri-se). Eu estabelecia regras muito rígidas relativamente ao meu espaço e devo ser a única mulher que conheço a face do planeta que abandonava os homens na cama a meio da noite para ir dormir para o sofá deles, tal era a minha impossibilidade de respirar! Por vezes, quando saiamos juntos, íamos a lugares maravilhosos e ridiculamente românticos como é o caso de Londres ou Paris, Barcelona, Madrid, Roma e por ai fora. Nas ruas avistava os casais em cenas impregnadas de tanto amor que até me dava um nó no estômago; aquilo era pior do que qualquer filme romântico, era tão real que gritava alegria, vida e amor verdadeiro. Por norma, eu tentava ignorar a paz absoluta daqueles momentos e concentrava-me na beleza das cidades em si. As cidades apaixonavam-me. Os seus monumentos faziam-me ficar grata pela distração que me proporcionavam. Sempre fui uma entusiasta de viagens, por isso, cada cidade em si tinha a capacidade de fazer-me ama-la e ser feliz nesse local, mas, era inevitável não passares por um local especifico e, como o tiquetaque de um relógio, despertares para uma sensação de vazio e dor beligerante ao trespassar-te o rosto do Tiago pela mente. Nessas alturas suspirava e aguentava estoicamente; eu parecia destinada a estar nos lugares mais românticos do mundo sem o homem que verdadeiramente desejava a meu lado. Essa é a estória da minha vida adulta ! Cheguei a sentir saudades da nossa vida de adolescente quando tudo o que possuíamos era uma mera escola, as minhas prerrogativas e a sua indulgência para comigo.

 

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Vanessa viu Tiago pela 1ª vez há 25 anos atrás, no falecido cinema Chaplin de Leça da Palmeira. Era apenas uma miúda de onze anos de idade e ele uma criança de dez. Em exibição encontrava-se o filme " Pretty Woman ". Vanessa confessou-me que - na altura - sentiu-se mais envergonhada e constrangida do que outra coisa qualquer, por estar a assistir a um filme tão ousado, acompanhada pela enteada do seu pai e com apenas mais três miúdos na sala que gracejavam por tudo e por nada e fizeram-na sentir extremamente pouco à vontade: " Nós erámos umas crianças a assistir a cenas sexuais implícitas. Recordo-me o momento em que Vivien vai ter com Edward ao loby do restaurante onde este tocava piano, e Edward a puxa para si, a agarra pelas ancas e crava a sua face bem no seio da cavidade das suas cochas. O Ivo e o Tiago só assobiavam. Eu - literalmente - escorreguei pelo banco abaixo, pejada de vergonha. Creio que essa é a razão - pela qual - só uns meses mais tarde eu viria a encarar o Tiago efetivamente. Cruzamo-nos na Figueira da Foz; embatemos de relance um no outro a saída de um autocarro. Curiosamente, não liguei (ri-se)! Já de regresso a casa, algures na A1, o Tiago meteu conversa comigo e o resto é história.(solta umas boas gargalhadas)

 

Helena Coelho: Contigo é impossível ter-se respostas sucintas (rio-me)! É melhor alternarmos para uma espécie de questionário, talvez seja mais fácil.

 

Vanessa Paquete: Mas porquê? Estou a ter um comportamento exemplar. Questionas-me eu respondo-te.

 

Helena Coelho: Sim, só que perdemo-nos sempre muito em pormenores e em detalhes e eu queria encetar outro gênero de entrevista contigo mas não consigo, eu própria deixo-me levar por essa estória, por aquilo que vais contando… Diz-me; recordaste de algum episódio específico com algum namorado teu que o Tiago estivesse na tua cabeça?

 

Vanessa Paquete: (a sua voz dá uma sonora gargalhada) Estás a brincar comigo? Queres que te enumere às centenas, aos milhares ou que escolha apenas um ou outro marcante?

 

Helena Coelho: (balbuciei um pouco ao responder-lhe, acabara de me aperceber que nunca esquecera o Tiago por um só segundo e que, efetivamente, parecia ser dona de uma vida dupla) Apenas um…ou dois, consoante preferires!

 

Vanessa Paquete: Existiram muitos para te ser honesta. Com variadíssimas pessoas diferentes. Por vezes, tinha em meu redor uma família inteira a planear a minha vida e futuro promissor, e a minha cabeça estava perdida numa carta que estava a redigir ao Tiago, num qualquer concurso internacional, para o qual, tinha de enviar uma série de letras de canções ou num programa de rádio, para o qual, tinha de escrever uns quantos poemas e o Tiago, claro, era a fonte de inspiração. Fui apanhada desprevenida, variadíssimas vezes, perdida nos meus devaneios, enquanto em meu redor toda a gente planeava a minha existência; não te soa estranho?

 

Helena Coelho: Parece-me estranho e uma verdadeira negligência da tua parte para com a tua própria vida. Eu sei que sempre detestaste que comandassem as coordenadas da tua existência, mas pude percecionar que muita gente acreditou em ti, investiu em ti e sonhou-te do seu lado, sogras, inclusive, o que é algo tão raro e invulgar.

 

Vanessa Paquete: Sim, é algo muito raro; uma sogra receber-te de braços abertos em sua casa logo após umas semanas de te conhecer. Mas aí encontra-se a ironia de toda a situação. Eu era uma rapariga muito bonita naquela altura, erudita, extremamente eloquente, muito bem-educada (treinara-me bem para conquistar o Tiago), parecia advinda de boas raízes, e, logo na primeira troca de palavras, conseguia sempre cativar os progenitores. Eu sempre fui muito maleável e adaptável. Quem passa pela casa de cerca de cinco a seis famílias em namoros já de contornos sérios, tem de se ambientar a dinâmica daquela prol e eu habituava-me muito facilmente as rotinas, apreendia os costumes das famílias, os seus afazeres. Alguns dos meus ex-namorados apaixonavam-se por mim e desejavam, de imediato, apresentar-me a família. Como deves calcular, na maior parte das vezes, ia reticente, mas, a minha carência familiar também era tão grande que não resistia. Eles ficavam deslumbrados comigo e acreditavam que eu era a pessoa perfeita para ser apresentada ao clã: em cerca de quatro namoros eu fui a primeira rapariga a pisar o chão da casa deles. Evidentemente, que, como deves calcular, uma mentira sustenta-se durante pouquíssimo tempo e se existe algo que eu aprendi com as mães dos meus ex-namorados é que realmente o coração de um mãe consegue intuir se aquela mulher ama o seu filho ou não. Eu não amava. Encontrava-me apaixonada secretamente por outro. Ninguém sabia quem era. Contudo, elas intuíam que o meu coração não pertencia ao dos seus filhos. A partir dessa descoberta, eu tinha de lidar com a desconfiança parental. As suas suposições incomodavam-me sobejamente. Era desagradável estares num local e as pessoas em teu redor, passado um ano, começarem a tomar-te por uma interesseira porque a família possuía uma série de posses. Eu própria acabava os relacionamentos ou fazia por os terminar, da maneira mais conveniente possível. O meu orgulho falava mais alto. Desde a adolescência que acreditava que o verdadeiro amor podia ser sustentado com afeição e uma cabana (ri-se), evidentemente, que as dezenas de pessoas que entraram na minha vida e o próprio Tiago viriam a provar-me o contrário. Mas (inspira profundamente), deixemos o capítulo da transição de famílias para outra altura porque, valha-me Deus, consegues imaginar o quanto tenho para contar?

 

Helena Coelho: (rio-me) Sim, imagino. Já começa a ser algo regular deixarmos todas as entrevistas com um desfecho em aberto. Começa a ser um péssimo hábito não se finalizar os capítulos, temos de aprimorar isso, portanto, conta-me os dois episódios que te pedi em que estivesses com um namorado e o Tiago estivesse na tua cabeça.

 

Vanessa Paquete: Ah, sim, olha dois deles aconteceram em dois momentos muito especiais da minha vida no ano de 2004: no concerto da Madonna, na sua Re-Invention Tour, e na Final do Euro 2004 no Estádio da Luz. Creio que aguardei uma vida inteira pela concretização desses dois sonhos. Sabes o quão sou ligada ao meio futebolístico, quer por afeição do coração, quer pelas minhas próprias raízes familiares que, em grande parte, têm ou tiveram conexões ao meio, nomeadamente a quatro Clubes distintos: o Leça Futebol Clube, ao qual o meu pai dedicou grande parte da minha adolescência estando sempre na mesa da assembleia do Clube, ajudando-o a singrar, dando o litro para que o Clube prosperasse; o Boavista Futebol Clube, do qual, o meu avô materno fazia parte da direção há cerca de quarenta anos, acompanhando o Clube para todo o lado, desde Ligas Europeias etecetera - nos tempos áureos do Boavista; o Benfica – o meu pai fez parte da Comissão que lutou arduamente para que a I casa do Benfica na nossa região da Invicta se erguesse e fosse inaugurada em Novembro de 2001 pelo próprio presidente do SLB, o Dr. Manuel Vilarinho -; e o Espinho onde alguns dos meus primos foram titulares da equipa Sénior.

 

Helena Coelho: (interrompo-o a meio) Ena, Ena, olha a baba a cair-te (rio-me imenso porque a pormenorização dos detalhes demonstra um grande orgulho na família, da qual, tão separada está) Esse é outro capítulo que não podemos deixar escapar (rio-me), temos de dedicar uma entrevista inteira ao meio futebolístico porque, de alguma maneira, a tua família, quer do lado paterno, quer do lado materno, esteve intrinsecamente ligada aos Clubes principais por onde o Tiago passou.

 

Vanessa Paquete: (ri-se descomunalmente) Creio que se não fôssemos tão casmurros e não tivéssemos criado uma tensão tão grande entre nós, erámos capaz de ter muitos assuntos em comum a abordar, mas, o Tiago é e sempre foi casmurro e apático para comigo e, verdade seja dita, eu também só abria a boca para dizer disparates e estupidezes: perdia o meu chão e atrapalhava-me sempre a seu lado. Era ciumenta, possessiva e amuava que nem uma criança. (faz uma pausa). Ainda amuo por causa dele (ri-se). Mas hoje quando olho para trás apercebo-me que tínhamos as mesmas raízes, consequentemente, muito para conversar, mas, eu era um cristalzinho muito delicado que se partia a mínima critica e ao mínimo olhar de desaprovação e, como já referi por diversas vezes, intimamente, sempre acreditei que era a boa aparência que ditava as suas amizades e não o intelecto ou a conversa, propriamente dita, por isso, cada qual tinha as suas convicções, crenças e religião e eu acreditava que a dele era aquela: um cocktail de beleza, sociabilidade e futilidade; algo que jamais eu lhe poderia oferecer, não naquela altura. O tempo e a arte de saber aguardar era o trunfo que eu tinha na manga (suspira)!

 

Helena Coelho: O teu pai acompanhou a ascensão vanguarda do Leça Futebol Clube a I Divisão, passava a vida junto do Clube e nas primeiras páginas dos jornais regionais. Sei que a tua relação com o teu pai é impossível de ser decifrada e está repleta de uma espessa camada de nuvens negras, contudo, orgulhaste bastante de tal ter-se passado.

 

Vanessa Paquete: Sim, quem não ficaria? (ri-se). Foi um momento apoteótico das nossas vidas e até eu que sonhava unicamente e tão simplesmente com as cores axadrezadas do Boavista Futebol Clube e ia absolutamente contrariada aos jogos do Leça, acabei por juntar-me a festa. Os meus quinze anos de idade livraram-me de ter de acompanhar o Clube para todo o lado e quando refiro todo o lado significa isso que, aos Domingos, era-me impossível sentar-me comodamente na cama e começar a mudar os canais de televisão distraidamente porque era dia de jogo e tinha de acompanhar a família: o meu pai, a uma dada altura da sua vida, com o seu terceiro casamento, tentou implementar uma filosofia muito cristã e tradicionalista no seio familiar: queria toda a gente unida! Eu achava aquilo algo estranho porque sempre acreditei em trajetórias de linhas retas, ou seja, uma família que possuía tantos solavancos e desvios de percurso como a nossa, quase que era indigna de se inserir naqueles cânones conservadores, porém, valeram as tentativas de redenção, acho eu (faz uma pausa), mas, adiante, eu sentia-me tão claustrofóbica que mal chegava ao estádio, encaminhava-me para o lado oposto das bancadas da minha família (ri-se). Quando a minha madrasta olhava para trás para depor os seus olhos sobre mim, eu já me havia esgueirado.

 

Helena Coelho: É verdade que também eras a única que não envergava as cores do Clube?

 

Vanessa Paquete: Como soubeste disso? Sim, é verdade, era muito difícil contrariar-me. Eu detinha uma personalidade indomável. Nunca percebi por que razão tinha de me arrastar atrás de um Clube, de vila em vila, de bandeira em estandarte e com um emblema verde e branco ao peito. Todos os restantes miúdos da minha casa (céus, parece que estou a falar de um orfanato - dá umas belas gargalhadas),faziam questão de vestir a camisola do Leça Futebol Clube mas eu esquivava-me sempre. Possuo uma fotografia comigo, tirada na sala de jantar da nossa casa, em que toda a gente está com uma taça de champanhe na mão a comemorar e a camisola do Leça vestida. É uma fotografia fantástica e uma boa recordação, apesar de eu não estar inserida na frame, como deves calcular. Um dia, numa próxima entrevista, abordamos mais amiúde o tema futebolístico pode ser?

 

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Em meados da década de 90, Vanessa, acreditava que o seu lugar era no campo que envergava as cores axdrezadas, lugar cativo do Tiago Madalena, enquanto campeão Juvenil da equpa do Boavista Futebol Clube, todavia, a sua familia era uma devota acérrima  do Leça Futebol Clube que, numa ascensão tão apoteótica, quanto controversa, foi galgando palmarés e divisões até atingir a I Liga. A familia que tinha grandes afinidades e conexões com o Clube, seguia-o para todo o lado, para grande desespero e tédio de Vanessa que sonhava acordada com o Tiago, e tão simplesmente com o Tiago. Por ironia do destino, Vanessa, não aceitava nem gostava de envergar a camisola do Clube, tampouco apreciava colocar o que quer que fosse em tons verde e branco: " Fazia-o como sinal de protesto, em jeito de contrariar a minha familia. Tal não me ilibava de assistir aos jogos ao Domingo de tarde no estádio, mas era a minha forma de rebeldia. " A sua madrasta que era uma fã incontestável do Clube, reagia com azedume  e tristeza a apatia de Vanessa para com o estandarte Leceiro, argumentando que ela só se interessava pelo Tiago. Vanessa confessa, rindo-se " Eu tinha por hábito andar sem óculos porque, embora sofresse de miopia, conseguia lidar muito bem com a minha deficiência ótica que era mínima. A minha madrasta costumava obrigar-me a colocar os óculos no estádio argumentando com desdém: " Escusas de te empinocar toda, o Tiago não está aqui, mas sim noutro estádio, bem distante deste. Põem-me os óculos na cara que quem tu queres não está lá em baixo no relvado." Mal sabia a sua madrasta que Tiago, efetivamente, acabaria por tornar-se capitão do Leça Futebol Clube, uns anos mais tarde, já na sua fase adulta (risos) 

 

Helena Coelho: Sim, claro: futebol, madrastas e Avenida Brasil (digo entusiasmada). É verdade que estás a visionar essa trama de ficção novamente?

 

Vanessa Paquete: Sim, é verdade! Tem uma estória de investigação excelente. Um argumento muito bem concebido e, por mais que eu tenha sido sobejamente gozada pelos amigos do Tiago, é óbvio que a Avenida Brasil me traz muitas lembranças a cabeça, mas, se não conhecem a nossa história passada não podemos estar a espera que alguém a vá entender. Não tem simplesmente a ver com o Tiago. Tem muitas referências ligadas a minha mãe na personagem da Adriana Esteves, e no seu passado encoberto e sombrio. A personagem da Carmem Lúcia tem alguns laivos das minhas discussões com a minha madrasta e o seu passado marcas impregnadas do passado da minha mãe, como tal, é uma mixagem que me comoveu muito. Muito mais do que a personagem da Débora Falabella, foi a personagem da Adriana que me entrou no coração, principalmente, o seu amor incondicional pelo personagem do Cauã. É ficção, já todos nós sabemos, mas os amigos do Tiago não sonham nem imaginam o quanto existem réplicas do meu passado por ali espalhado e, claro, o futebol… os “ goleiros “ do Divino Futebol Clube e a história de um amor de infância como para-quedas para as intempéries da vida! O futebol de um Clube da Divisão B e o amor de infância de um catraio de doze anos: impossível de resistir para alguém com uma história tão sui generis como a minha. Numa narrativa muito complexa e singular foi como se, finalmente, alguém me tivesse dado razão e estivesse a comprovar que aquilo que eu apregoara durante anos era possível. Finalmente arranjara uma aliada na trama de João Emanuel Carneiro. Foi um grito de “ Aleluia “. Sinceramente, sendo fã da Rede Globo, para mim, a Avenida Brasil, foi a cereja no topo do bolo das suas produções!

 

 

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    Cauã Reymond enquanto jogador do Divino Futebol Clube                    Tiago Madalena no Perafita Futebol Clube

 

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Vanessa confessou ter-se inspirado na trama de Avenida Brasil para retratar o jogo deTiago.

As semelhanças estão a vista desarmada.

 

Helena Coelho: Vanessa (exclamo algo exasperada) os episódios por favor… Desta vez, parece que conseguiste escapar-te exemplarmente a perguntas mais diretas. Eu não quero finalizar a entrevista abruptamente e, sinceramente, ainda estou a ponderar se te deixo escapar do questionário (digo maliciosamente). Tu filtras tudo de uma maneira muito inteligente, fico sempre com a impressão de que foges a colocar o dedo na ferida. A tua diplomacia e educação para com o Tiago nunca vai ter um término? Vais continuar a mesclar estas páginas com mel e compota e a enchê-las de floreados? De cada vez que dizes algo mais incisivo, dás uma palmadinha nas costas por detrás e desculpas-te perante ele? Não consegues mesmo evitá-lo pois não?

 

Vanessa Paquete: Evitar o quê? (pronuncia com estranheza)

 

Helena Coelho: Amá-lo! (digo-o descaradamente)

 

Vanessa Paquete: (silenciou-se, creio que pasmada, e a tentar elaborar a resposta politicamente correta) Não sejas tonta! Simplesmente não desejo tatear um caminho às cegas e dizer parvoíces pelo meio, das quais, me hei-de arrepender um dia mais tarde. Sabes tão bem quanto eu que estou a caminhar descalça sobre montículos de fogo (pareceu-me irritada e de humor alternado de novo). Voltando, finalmente, ao concerto da Madonna, na sua Re-Invention Tour, e a Final do Euro 2004 no Estádio da Luz, esses dois momentos da minha vida, foram particularmente especiais para mim; vivi-os extasiada e com os pés sempre a levitar no ar. Era uma visão brilhante e demasiado ofuscante: dois dos meus maiores sonhos haviam-se tornado realidade, num curto espaço de três meses. Algures, no meio do seu alinhamento de reportório, Madonna interpretou no palco da Meo Arena “ Crazy For You “ . Sendo a minha música preferida da adolescência e um daqueles temas que andava sempre a trautear para o Tiago, escutá-la live, pela 1ª vez, foi uma emoção impossível de ser descrita. Pedi ao Duarte que me erguesse. Pousei as minhas mãos nos seus ombros segurando-me, com os dedos a fletirem-se com força nas suas costas. Chorei que nem uma perdida durante toda a interpretação da Madonna. Os meus olhos cegaram por completo com a lembrança do Tiago na minha cabeça. Apenas conseguia pensar nele e contemplá-lo a ele. Quando o tema finalizou e o Duarte me fez regressar ao piso da Meo Arena, ambos nos retraímos. Ele olhou-me algo espantado. Eu recuei e limpei freneticamente o meu olhar mas apenas conseguia pisca-lo febrilmente de cada vez que os meus olhos eram inundados de lágrimas. As pessoas em nosso redor contemplaram-nos vendo aquele meu choro lacrimal; eu havia desabado por completo! Salvou-me Madonna com “ Music “ e “ Holiday “ logo de seguida. Até os dias de hoje é o tema que eu e a Carla mais interpretamos quando cantamos juntas pois ela sabe o quanto “ Music “ representou para mim naquele dia. Foi o antídoto para as minhas lágrimas e a energia que eu precisava para fazer o espetáculo continuar.

 

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Vanessa, enquanto adolescente, sonhava ser como a Rainha da Pop, confessando, que Madonna foi uma grande inspiração para si ao longo de toda a sua vida.

 

Helena Coelho: E o outro quando aconteceu?

 

Vanessa Paquete: Na Final do Euro 2004, no Estádio da Luz. Não houve um único minuto da viagem nesse dia, um único segundo passado em Alcochete, na Academia ou um único momento do jogo em que não me recordasse do Tiago. Pensava sempre o quanto ele deveria adorar estar ali.

 

Helena Coelho: Nunca te ocorreu que ele poderia estar no mesmo local que tu a assistir a Final do Euro 2004, exatamente ali, no Estádio da Luz?

 

Vanessa Paquete: Sim…Mas como poderia sabê-lo?

 

Helena Coelho: Tenho uma última pergunta para te colocar que deixamos em aberto na última entrevista. Foste abandonada a porta do Tiago, no auge da madrugada, de uma noite estival do ano de 2005: como foi o desfecho dessa noite?

 

Vanessa Paquete: (silêncio) Fiquei atordoada. No rádio do carro tocava “ In Too Deep “ dos Genesis; uma música perfeita para uma despedida não achas? As minhas pernas enfraquecidas não me faziam avançar, o meu choro convulsivo não me permitia raciocinar; não conseguia caminhar até casa! Acabei por deixar-me ficar no chão, agachada entre duas viaturas que se encontravam estacionadas diante da porta do Tiago, premi a minha cabeça de encontro aos joelhos, abracei-os com as minhas mãos e desmanchei-me em lágrimas, tentando silencia-las para não atrair a atenção de ninguém sobre mim. Quando o Tiago chegou, vindo de uma saída qualquer entre amigos ou com outra mulher, virei-me de lado, subtilmente, para confirmar mesmo se era ele. As lágrimas irromperam-me ainda mais pelos olhos quando constatei que sim, que era ele. Tive de enroscar-me muito cuidadosamente sobre o meu próprio corpo para não ser descoberta, conseguir respirar, em simultâneo e abafar o meu choro. Sentia-me completamente desorientada e apenas as 06.00 da manhã consegui ser impelida pela minha consciência a ganhar forças para ir para casa.

 

Holliday LIVE em Lisboa, em Setembro de 2004, a música que salvou Vanessa, após ter escutado Madonna interpretar " Crazy For You " no hoje renomeado " Meo Arena ". “ Crazy For You “ , sendo a minha música preferida da adolescência e um daqueles temas que andava sempre a trautear para o Tiago, escutá-la live, pela 1ª vez, foi uma emoção impossível de ser descrita. Pedi ao Duarte que me erguesse. Pousei as minhas mãos nos seus ombros segurando-me, com os dedos a fletirem-se com força nas suas costas. Chorei que nem uma perdida durante toda a interpretação da Madonna. Os meus olhos cegaram por completo com a lembrança do Tiago na minha cabeça. Apenas conseguia pensar nele e contemplá-lo a ele. Quando o tema finalizou e o Duarte me fez regressar ao piso da Meo Arena, ambos nos retraímos. Ele olhou-me algo espantado. Eu recuei e limpei freneticamente o meu olhar mas apenas conseguia pisca-lo febrilmente de cada vez que os meus olhos eram inundados de lágrimas. As pessoas em nosso redor contemplaram-nos vendo aquele meu choro lacrimal; eu havia desabado por completo! Salvou-me Madonna com “ Music “ e “ Holliday “ logo de seguida. Aqueles dois temas foram o antídoto para as minhas lágrimas e a energia que eu precisava para fazer o espetáculo continuar.

 

 Vanessa Paquete 2015 ©

Helena Coelho 2015 ©

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

TIAGO MADALENA ( V INTERVIEW ABOUT HIM - VERDADE OU CONSEQUÊNCIA; AS PALAVRAS E OS SEGREDOS QUE SE OMITEM )

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Passou-se um mês até conseguir uma V entrevista com a Vanessa. Para trás ainda se encontravam todas as nossas conversas feitas presencialmente em Setúbal, conversas essas que, muito preguiçosamente, ela nem pegou. Pareceu-me que o progresso nas transcrições das mesmas estava a ser um processo moroso e algo complicado para ela, ou tão simplesmente, Vanessa arranjara tal como desculpa, pois evadia-se do assunto sempre que eu o focava. A sua ausência confidencial na rede cibernauta que costuma utilizar também me levou a crer que algo se havia transformado nela; de uma Vanessa intimista e sempre pronta a dinamitar o mundo, passamos a ver uma Vanessa muito mais recatada, silenciosa, pouquíssimo focada no seu passado ou nos seus males presentes e mais direcionada para dar-nos alguns bons singles de música ou exibir o seu trabalho enquanto fotógrafa e jornalista/escritora! Dado o contexto da nossa última conversa, e por aquilo que já havia percecionado no próprio Blog, havia algo relativamente as nossas conversas acerca do Tiago que a maçava francamente, como se já não dispusesse de tempo ou paciência sequer para as encetar, por isso, foi com grande espanto meu que rececionei um telefonema seu espontâneo, a comunicar-me que estava pronta para a próxima entrevista. Tinha acabado de fazer um Evento e planeava ficar parada durante umas semanas, e estava disponível para entrar numa série de telefonemas regulares comigo. A nossa conversa, propriamente dita, teve lugar só duas semanas depois desse seu inesperado telefonema. A sua voz soava como um sussurro, como uma espécie de cântico subaquático de tão letárgica que era. Como sempre – na Vanessa – tudo é imprevisível; acabamos a falar de tudo e mais alguma coisa, desde relacionamentos, a Tiago, futebol e Avenida Brasil (risos).

 

Nesta entrevista apanhei-a desprevenida com um “ Verdade ou Consequência “, do qual, ela tentou escapar-se. Não tendo conseguido escapar-se ao fatídico questionário, a entrevista foi encetada, mas, as suas questões e respostas, ao fazer-se a transcrição para o Blogue serviram de interlúdio para a mesma.

 

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“ Truth Or Dare/ No Substitute For Love “

 

Helena: É difícil tentarmos magoar alguém que desejamos tão próximo de nós?

 

Vanessa: Sim (protestou)! Porém, quando nos apercebemos disso e equacionamos que todas as nossas provocações ou tentativas de bala fazem ricochete, baixamos os braços, e resignamo-nos ao fatídico veredicto da rejeição.

 

Helena: Porquê tentar magoar alguém que desejamos tanto? O que se recebe em troca?

 

Vanessa: Vai ser difícil responder-te a esta questão. Não to sei explicar. Creio que varia da personalidade de cada um, do seu caracter e do seu background emocional: é uma equação complexa. Eu possuo uma personalidade muito passional. Sempre que tentei magoar o Tiago, acabei reduzida a uma tristeza interior incontrolável, banhada num rio de lágrimas e coberta de vergonha. Acabava sempre por me arrepender. Era nessas alturas que eu me apercebia sempre que não podia ser uma pessoa de má índole porque quem pratica o mal sente prazer nos seus atos; e eu sentia-me simplesmente destroçada, como se me tivessem arrancado o coração. Obviamente, que ao tentar magoar quem amava, inferia um duro golpe em mim própria.

 

Helena: É verdade que possuis uma pessoa muito próxima de ti que te escondeu tudo acerca da vida do Tiago nos últimos dois anos?

 

Vanessa: (risos) Sim, é verdade! É a pessoa mais íntima da minha existência. Aquela, da qual, eu jamais desconfiaria algo. A pessoa que é a minha sombra vinte e quatro horas sobre vinte e quatro horas. Essa pessoa possuía contacto sem eu saber com todo o círculo íntimo do Tiago, consequentemente, não só sabia de absolutamente tudo o que ele fazia, como de tudo o que acontecia próximo de si. Eu não suporto que subestimem a minha inteligência e me deixem na escuridão ou a encenar um papel patético que foi o que essa pessoa me deixou fazer. (ri-se)

 

Helena: Perdoaste essa pessoa?

 

Vanessa: Sim, em absoluto! Olhando para trás, consegui percecionar, que esse individuo me ia dizendo tudo sob indiretas. Eu é que não acatei nenhum dos seus ditos ou conselhos. Tinha uma ideia enfiada na cabeça e levava a reboque comigo essa ideia, para onde quer que eu fosse, consequentemente, fiz o maior papel de idiota que existe a face da terra nos últimos dois anos (dá umas sonoras gargalhadas).

 

Helena: Se soubesses o que sabes hoje terias ido na mesma fotografar o Tiago no jogo do Boavista?

 

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Vanessa: (fica pensativa) Eu mudei toda a mecânica do meu Blogue a partir do momento que soube que outra pessoa entrou na sua vida. Nem eu própria consigo compreender o porquê. Quando iniciei este Blogue, sentia-me como uma concha vazia, uma casa vaga, simplesmente condenada; como se estivera inabitável durante meses. Escrever para o Tiago era como fazer um restauro ao quarto em degradação, era a única maneira de conseguir reabilitar-me: sempre foi, sempre precisei dele para colmatar o vácuo no meu coração. O registo fotográfico do jogo com o Boavista não foi premeditado, mas sim, um acaso do destino ou um laivo de intuição; literalmente fui arrastada para o jogo por circunstâncias inalienáveis do destino. Se os mais românticos preferirem, podemos afirmar, que o meu coração intuiu algo ou já andava a intuir algo há muitos meses. Eu vim a Leça com o objetivo de obter respostas para as minhas dúvidas. Mal desci do Alfa Pendular a primeira coisa que fiz foi passar pela casa da sua mãe e a sua velha rua. Recordo-me que coloquei todos os meus sentidos em alerta e que parei por uns minutos diante da sua porta como se estivesse a tentar senti-lo, respirá-lo… Mas – do fundo das minhas entranhas, do intimo do meu ser, desde a cabeça aos pés, devo confessar que não consegui percecionar absolutamente nada. Aliás, devo dizer, que sai de lá com a certeza absoluta que aquela rua não era mais habitada por ele: eu já não o conseguia sentir; compreendes? Durante anos tivera essa capacidade e esse dom inato… de senti-lo (suspira).

 

Helena: Por isso foste ao estádio – o único lugar público e neutro – onde poderias comprovar com os teus próprios olhos a sua existência palpável?

 

Vanessa: Sim (disse engasgada), embora, como te tivesse explicado já anteriormente: não foi nada premeditado. Aconteceu. Sei que parece absurdo e ridículo mas, de repente, deixara de sentir a sua energia. Talvez os quatrocentos e cinquenta quilómetros de distância o tivessem libertado de mim, mas, nos meus sonhos ele ainda me aparecia e, desta feita, já com um papel parental e uma criança a seu lado e, digamos de passagem, bastante feliz. Deduzi que a sua namorada de longos anos estivesse gravida, todavia, enquanto eu me tentava segurar firmemente a essa convicção, havia vozes dispersas que contrariavam a minha teoria. Acabei por sentir-me demasiado confusa para reagir, durante uns tempos. De cada vez que tentava questionar alguém, as suas conversas alteravam-se. Sinto que toda a gente – não apenas um único individuo – me tentaram esconder a verdade. Não sei se hei-de achá-lo um ato lisongiador visto que demonstra uma grande cautela e preocupação para comigo, ou um abuso da minha cegueira e distração.

 

Helena: É verdade que existe uma mítica frase proferida por ti em que dizias: “ Podem dar-me qualquer notícia no mundo que não receio nada que advenha daí, mas, por favor, quando o Tiago se casar, não mo comuniquem, por favor quando o Tiago for pai, não mo digam, por favor se os sinos da igreja replicarem no dia do seu matrimónio, arrastem-me de Leça para um lugar bem longe dali. Não me digam nada. Simplesmente ajam e salvem-me de mim própria “

 

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Vanessa: (ri-se descomunalmente) Meu Deus, quem te deu isso para ler? Estou a começar a ficar assustada com essas tuas incursões ao mais intimo de meu ser. (faz uma pausa e murmura baixinho) …Mas sim, existe essa mítica frase escrita por mim, todavia, passaram-te mal a mensagem (ri-se), era “ … salvem-me da minha dor “ e não “ … de mim própria “.

 

Helena: Tens a certeza?

 

Vanessa: Não, não tenho, para te ser honesta, por isso não vou contraria-te. Repete lá a frase, por favor, que o seu lirismo é surreal (risos).

 

Helena: “ Podem dar-me qualquer notícia no mundo que não receio nada que advenha daí, mas, por favor, quando o Tiago se casar, não mo comuniquem, por favor quando o Tiago for pai, não mo digam, por favor se os sinos da igreja replicarem no dia do seu matrimónio, arrastem-me de Leça para um lugar bem longe dali. Não me digam nada. Simplesmente ajam e salvem-me de mim própria “

 

Vanessa: (permaneceu silenciosa por uns instantes, quase como se não conseguisse acreditar que tivesse proferido tal) Olha, nem Shakespeare ou Christopher Marlowe teriam conseguido fazer melhor (ri-se), absolutamente mítica essa frase!

 

Helena: Sentes que cumpriram com o prometido?

 

Vanessa: (solta umas estridentes gargalhadas) Mas não está mais que visto que sim; rigorosamente e a letra. Nem uma única palavra acerca do assunto. Afastarem-me de Leça não foi necessário porque eu antecipei a jogada no tabuleiro de xadrez uns anos antes.

 

Helena: Sentes-te um peão num tabuleiro de xadrez, traída pelas circunstâncias da vida?

 

Vanessa: (começa a cantarolar num francês algo impercebível para mim) … “Que faire de nos guerres je n'y tomberai pas, Echec et Matt hier je n'y reviens pas, apprendre et se taire, en casser parfois, inspirer de l'air, expirer de toi… “

 

Helena: Desculpa, estou perdida…

 

Vanessa: (rapidamente traduz-me a sua resposta) “ Que fazer das nossas guerras? Eu não render-me-ei! Xeque-Mate, ao passado eu não hei-de regressar. Aprender a calar-me, ficando destroçada, por vezes, inspirar oxigênio e expirar-te a ti “

 

Helena: É uma canção?

 

Vanessa: (ri-se) Sim, da cantora belga Lara Fabian; um dos seus melhores textos! Lindo de se trautear, magnificente de se escutar, mas muito difícil de se colocar em prática. É a minha antítese e a resposta a tua pergunta: quem não deseja fazer Xeque-Mate no jogo que mais luta lhe deu na sua vida?

 

AIMER DÉJÁ é um dos singles da cantora belga, Lara Fabian, mais acarinhado pelo seu público. A letra que terminha com um redentor " Não eras tu. Eu não o sabia. Eu não te culpo. Não mais que a mim própria. Mas que fazer de " estar a AMAR-TE JÁ? " é um dos poema preferido dos seus fãs.

 

Helena: É verdade que o Tiago Madalena foi o único rapaz/homem que te rejeitou ao longo de toda a tua existência?

 

Vanessa: (fica pensativa) Hum (ri-se) esta resposta vai soar-te tão absurdamente presunçosa, mas, sim, nenhum outro homem mais me rejeitou. Nem sequer sei o que isso é. Tive, como em todas as relações, situações de crise, onde o desgaste, ou os desentendimentos ou a própria incompatibilidade de vidas, nos fez seguir caminhos distintos, mas com todos os “ homens da minha vida “, os meus cabelos caíram em feixes sobre os seus peitos, madeixa a madeixa, os nossos hálitos mesclaram-se e transformamo-nos num só. O Tiago foi o único, cuja pele, não pude tocar, cujo corpo, não pude amar. Nunca pude comprimir os meus dedos em torno do seu pescoço e seguir a linha do seu maxilar. Nunca pude esmaga-lo no meu abraço e apertar-lhe a cintura, ficando aninhada de encontro ao seu peito a escutar o bater do seu coração. Nunca pude beijá-lo – a não ser na face, perto da cavidade dos seus lábios. Ele sempre me enfrentou com uma resistência passiva. Todos os restantes rapazes e homens que entraram na minha vida foram “ meus “; sempre os pude acarinhar e endossar-lhes o meu sorriso. Nunca existiram amigos quantificáveis entre nós. Nunca existiu – na realidade – absolutamente nada que se interpusesse entre nós porque eu não o permitia; respondi a tua pergunta?

 

Helena: Da maneira mais direta que poderia existir: o Tiago foi “ The One That Got Away “? (pergunto-lhe hesitante)

 

Vanessa: (ri-se) Agora vamos começar a trautear Katy Perry? (o pior é que Vanessa associou mesmo a frase ao tema e começa a canta-lo) …In another life I would be your girl I'd keep all my promises, be us against the world, In another life I would make you stay So I don't have to say You were the one that got away, The one that got away… “

 

Helena: Não o disse nesse sentido (sorrio perante a sua paixão fonográfica) mas identificas-te com a canção?

 

Vanessa: (faz um gracejo) A exceção do refrão, não! Mas quem me dera que o Tiago tivesse sido o meu Johnny Cash e eu a sua June (diz com uma voz de pesar)

 

 

Joaquin Phoenix interpretou no ano de 2005 o papel de Johnny Cash, no filme que retratava a vida da lenda viva do Rock & Roll. Johnny deixou o seu cunho bem vincando no mundo da música, quer pela sua ousadia e rebeldia, bem como pela sua personificação irreverente do " homem de negro ", cor que Cash usava sempre para qualquer lado que fossse. Numa vida repleta de adicções, inconstâncias, rebeldia, drogas e rock & roll, a cantora de country/folk June Carter foi a sua luz nas avenidas nublosas da sua mente. O romance floresceu quando June ainda era casada, mas, depressa Cash transformou-se no amor da sua vida, apesar de todas as suas incapacidades para se adaptar a uma vida normal, sem dependências, álcool e tumultos. A dupla ficaria recordada para sempre  como um exemplo de amor a seguir, June era uma católica ferverosa e uma mulher de boa índole. O filme Walk The Line retrata, de uma maneira extraordinária, a forma como June " colocou Cash na linha ".

 

 

Helena: Sentes saudades das belíssimas cartas de amor que escrevias ao Tiago e publicavas no Blogue ou continuas a escrevê-las em privado?

 

Vanessa: (quase que a sinto a franzir o sobrolho) Que pergunta mais indiscreta! Sim, sinto muitas saudades de lhe escrever, porém, nunca mais consegui declarar-me e abrir-me perante ele após saber da entrada de uma nova pessoa na sua vida. (fica pensativa) Bom, na realidade, as entrevistas que enceto contigo acabaram por substituir de uma maneira mais pragmática as minhas conversações com ele, todavia, confesso-te, falar contigo não é a mesma coisa que falar com ele. Sempre senti um sentimento de grande aproximação e um elo invisível quando falava de um modo epistolar “ tu cá, tu lá “ com o Tiago. Era como se o tivesse diante de mim…

 

Helena: Se tivesses oportunidade de conversar frente a frente com o Tiago, o que lhe dirias?

 

Vanessa: (a sua respiração quase que cessou) Acredito que acabaria por ficar paralisada. Haveria de permanecer imóvel, muda e queda diante dele. Se tentasse dizer alguma coisa, haveria de me engasgar, falaria tudo de uma maneira atabalhoada. Se tivesse de andar, haveria de cambalear junto dele. O meu olhar haveria de ficar aturdido e distante, o meu rosto pejado de vergonha e mais branco do que a cal. Todo o meu corpo haveria de tremer num tumulto interior, consequentemente, fugiria (ri-se). Tê-lo a minha frente sempre fez a minha cabeça andar a roda e dava-me náuseas no estomago; era acometida por um ruído cavernoso que sentia nos ouvidos, o cérebro deixava de trabalhar e todo o meu ser vacilava, por isso, em suma, não dir-lhe-ia nada.

 

Helena: Mas é verdade que o fizeste quando tinhas apenas dezasseis anos de idade?

 

Vanessa: (suspira profundamente, faz uma pausa e prossegue) A louca e insana determinação de uma impúbere adolescente que, num ato impensável de coragem, precipita-se sobre o Tiago - e nem a rispidez do seu acolhimento a demove – o fita nos olhos e declara-lhe o seu amor. A sua audácia fê-lo contrair os maxilares e movimentar energicamente o molhe de chaves entrelaçadas nos seus dedos (faz uma pausa). Se pudesses contemplar a maneira como ele me olhou de um modo inexpressivo, com os seus olhos castanhos aveludados penetrantes, a estremecerem firmemente. Eu pude percecionar o seu estado de apreensão, a tensão a percorrer todo o seu corpo como eletricidade e um vago tremor a percorrer-lhe a coluna, sacudindo-o interiormente. Porém, ainda que estivesse a praguejar mentalmente no seu subconsciente, e diante de mim de má vontade, e a lançar-me palavras contritas com a voz fria que nem gelo, a verdade é que, desajeitadamente, ainda tentou consolar-me.

 

Helena: A sério? (pergunto algo espantada)

 

Vanessa: Sim, é verdade.

 

Helena: Estou curiosa; como conseguiste convencer o Tiago a escutar-te? E como tomaste essa resolução? Foi premeditada? Um acaso?

 

Vanessa: Um dia, cruzei-me com o Tiago e fui tomada por um súbito paroxismo de desespero ao encarar a realidade que jamais o conseguiria conquistar, e, então, decidi que teria de lhe falar. Havíamos passado por momentos bastantes constrangedores e de animosidade ao longo de todo aquele ano letivo; precisava compreender o porquê, a razão de ele ter deixado de me falar, sorrir e até cumprimentar-me. O Tiago, simplesmente erguera um muro intransponível entre nós dois, ele não me queria mais a vaguear pelas proximidades de qualquer local onde estivesse: porquê?

 

Helena: Vocês pareciam ter conseguido entender-se numa altura em que, pura e simplesmente, tu descobriste que para manter o Tiago junto a ti, o segredo era mentir-lhe e ocultar-lhe os teus sentimentos, não é verdade?

 

Vanessa: (ri-se) Sim. Infelizmente, eu apaixonei-me por alguém muito precocemente, a vida familiar era uma caocidade total, e eu necessitava daquele sentimento para respirar, era o meu alento de vida… A meio da minha adolescência, nos meus quinze anos de idade, percecionei que a estranheza do Tiago e do Ivo, igualmente, ante mim, haviam desaparecido, após o Verão que havíamos convivido juntos. Talvez por terem convivido tanto comigo naquela época estival. Ter uma atitude “ normal “ ante eles fê-los quebrarem barreiras. De repente, ao invés de esboçarem apenas um sorriso parcial, endossavam-se esgares cordiais e repletos de simpatia. O meu teatro fora bem encenado; arranjara um namorado, irrompia por tudo e por nada com nomes de outros rapazes por quem, hipoteticamente, me encontrava apaixonada. Mentia ante o Tiago noite e dia, mas mentir-lhe foi a única maneira de chegar até ele: enquanto lhe menti fui imensamente feliz e uma aluna exímia e exemplar. O Tiago fazia-me feliz. Não era preciso plagiarmos amores fatídicos de obras ancestrais ou sequer incarnar uma imitação perfeita dos meus delírios de jovem apaixonada. Bastava ver os seus olhos a brilharem todos os dias bem diante do meu olhar, sentir o seu sangue a afluir-lhe a cara. A minha boca tratava de formular-lhe, discretamente, cada palavra de amor em silêncio. “ Mentir-lhe não é assim tão mau! Mentir-lhe é a solução! “, dizia a mim própria para tentar consolar a minha mente. E era verdade. Não era assim tão mau. Não era o fim do mundo. Era apenas o início de algo que eu almejava encontrar junto dele. Mais nada.

 

Helena: O que aconteceu, então?

 

Vanessa: (ri-se) No entretanto, muitos momentos agradáveis e pacificados, FINALMENTE! Depois, a minha cabeça começou novamente a desorientar tudo e a minha máscara caiu. O que eu mais receava aconteceu. Creio que as ideias do Tiago clarearam-se. Causou-me uma dor imensa vê-lo a afastar-se de mim, a desprezar-me… Apetecia-me cravar as minhas unhas no braço dele e perguntar-lhe frontalmente: “ Hey, qual é o teu problema comigo afinal? Não fiz tudo como era suposto ser feito? Não me remeti a um canto com a minha voz extinta? Não me silenciei? Há meses que estou a escassos centímetros da ti, alguma vez me viste ou sentiste a precipitar-me ante ti? Eu embrenhei-me num mar de mentiras para ocultar o que sentia por ti, magoei outras pessoas, engendrei planos para conceber paixões avassaladoras que pudessem saciar a tua imaginação e apaziguar-te o coração. Eu abafei as palavras na minha garganta; que mais queres tu de mim: diz-me, que mais queres tu de mim Tiago? “

 

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Helena: (ao proferir o último paragrafo a sua voz soou-me embargada, estava comovida, não creio que numa idade tão precoce tivesse dito aquilo que sentia com tamanha eloquência, muito provavelmente tê-lo-ia feito num tom mais juvenil e com algum calão à mistura, contudo, consegui percecionar que aquilo era exatamente a cor do seus sentimentos – a sua voz denotava comoção ao relatar um episódio de há vinte anos atrás) Por isso sentiste necessidade um ano mais tarde de questioná-lo, de confrontá-lo…

 

Vanessa: Sim, como receei que ele me virasse as costas em público, manifestando repugnância e acusando-me de ser uma súcia ou uma parasita, decidi abordá-lo em privado e longe dos portões da secundária. Esperei-o a porta de sua casa e murmurei-lhe laconicamente se podíamos conversar. Ele respondeu-me com um encolher de ombros apologético; claramente fora apanhado desprevenido, e não sabia se haveria de virar-me as costas e entrar em casa, ou sentar-se um pouco comigo a conversar. Presumi que ele fosse ficar abalado – o que acredito veementemente que ficou – e fugir apavorado para dentro de casa; afinal de contas, o local onde eu o confrontara, dava-lhe hipóteses para tal fuga, porém, ele escutou-me e também expressou-me os seus sentimentos. O meu estômago contorceu-se quando me apercebi daquilo que ele me tentava transmitir. Ele sabia o quão fascinada eu estava por ele; não quis dar-me falsas esperanças, logo, não podíamos mais sequer ser amigos pois ele não estava minimamente interessado em mim: eu não encaixava nos cânones de beleza do Tiago Madalena!

 

Helena: Homens há muitos?

 

Vanessa: (dá umas gargalhadas subtis) As dezenas, Helena! Eu sou a prova viva de tal afirmação, porém, homens podem existir muitos, mas amor verdadeiro, apenas um.

 

Helena: É verdade que te aconselham a engravidares para esqueceres o Tiago?

 

Vanessa: (faz um gracejo malicioso) Insinuam-me tal variadíssimas vezes o que é uma completa barbaridade e estupidez. Eu jurei sobre o túmulo da minha mãe ter um filho, única e exclusivamente, do homem que eu amasse. De igual modo, jurei-lhe entregar-me de alma e coração a uma vida de papel passado e consumação de matrimónio, apenas ao homem que eu amasse. Ponto. Nada nem ninguém me iria demover desse propósito. Passados dez anos exatamente, creio que fui fiel a jura que fiz a minha mãe: não me casei nem tive filhos! O meu tempo já passou, Helena…

 

Helena: Qual foi a coisa mais inconcebível que te disseram?

 

Vanessa: (ri-se) Disseram-me com azedume “ vive a tua vida, por favor “! É a coisa mais descabida e idiota que podem dizer a alguém que não possui família e que, mesmo quando possuía dois empregos, um namorado, um clã de vinte pessoas a mimá-la, empregadores fenomenais, projetos de vida, dinheiro e saúde, arranjava sempre, cerca de meia hora do seu dia para se questionar acerca do seu paradeiro e – no silêncio da noite – escrevia-lhe palavras que eram como um lamento surdo de saudosismo.

 

Helena: Foi o Tiago que te disse tal?

 

Vanessa: Quem mais poderia ser?

 

Helena: É verdade que especialistas na matéria afirmam que utilizas o Tiago, unicamente, como escudo protetor de um mundo que te assusta?

 

Vanessa: (retrai-se a responder) Os homens são terríveis, Helena. Um amor pode destruir-te. O amor faz com que fios de lágrimas se te escapem pelo canto dos olhos e de nada adianta limpa-las com as costas da tua mão e cruzares os braços sobre o peito; o amor há de sempre aniquilar-te, Helena!

 

Helena: Jesus, que visão tão pessimista da vida!

 

Vanessa: Se possuis há 25 anos um amor que já te fulminou há séculos e encontras-te de mãos dadas com ele, pacificada com os seus vestígios de ruína e os danos colaterais que fomentou na tua vida, por que razão hás-de partir do teu mausoléu mais secreto e acolhedor em busca do Santo Graal? Homens como tu disseste, há-os muitos, e eu já tive o privilégio de brincar a protagonista de filmes de comédia romântica britânica, por diversas vezes. E fui muito feliz no meu papel de mulher apaixonada, a romancear dezenas de paixões: que mais posso desejar? Vi a vida passar-me diante dos olhos. Estive em todos os lugares-comuns. Oportunidades surgiram. Quiçá, talvez, não tenha sabido agarra-las. Uma lição aprendi nesta vida; talvez a maior de todas: se não possuis os braços de uma mãe ou um pai para te abraçarem quando a vida te for tão insuportável que os teus pulmões começam a doer somente por respirar e as tuas pernas ficam com cãibras com medo de caminhar, desiste! Desiste porque a contracorrente da vida há-de levar a sua melhor sobre ti, e quando isso acontecer vais correr para os braços de quem? Do pai que nem sequer quer saber da tua existência? Da mãe que te faleceu? Dos irmãos que ignoram o sangue que lhes corre nas veias? (silencia-se por momentos)

 

Helena: Desculpa dizer-te isto, mas sinto que vês a vida, as pessoas em si, como grandes monstros com tentáculos prontos a perseguirem-te e causarem-te pânico: a vida e as pessoas assustam-te…

 

Vanessa: Enquanto amei o Tiago, Helena, havia uma força que me sustinha, uma vontade férrea de lutar. Era como se ele desencadeasse em mim os meus instintos mais primitivos de sobrevivência. Nas horas mais amargas da minha existência, o meu subconsciente gravava o rosto do Tiago ao pormenor. Conseguia vê-lo na perfeição, como se ele estivesse ali a minha frente; a forma dos seus lábios, o contorno do seu maxilar, o brilho dourado do seu olhar, e tal dava-me forças, forças para não ceder ante tentações, forças para não cair nas malhas da prostituição somente para sobreviver, forças para não me tornar numa alcoólatra ou numa toxicodependente, forças para enfrentar uma vida de poucos recursos e solitária a viver da piedade alheia, da ajuda solidária de instituições. O Tiago foi a minha salvação quando eu estava a afogar-me. O Tiago estava lá, no meu subconsciente, quando o frio da água me entorpecia os braços e as pernas e tudo o que eu sentia eram vertigens. Como queres que eu esqueça quem me injetava força?

 

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Helena: Como te sentiste quando percecionaste que já não o amavas mais?

 

Vanessa: Senti-me como se tivesse sido atirada de uma falésia e tivesse embatido com todo o meu corpo na crispação da ondulação do mar. As ondas atiravam-me de um lado para o outro, chicoteavam-me, puxando-me ferozmente para me partir em pedaços. A violência das águas turvas cegaram-me e puxavam o meu corpo para o fundo do oceano. Já não havia mais ar para respirar, eu continuava a cair em sentido descendente, a afundar-me cada vez mais: senti-me completamente perdida! Sem o Tiago no meu subconsciente, o meu coração começou a despertar para uma dor pungente que agora me aflorava o peito: que faria eu neste mundo sem um pai e uma mãe? Que faria eu neste mundo sem os meus irmãos? O Tiago fora tudo para mim. Deixar de ama-lo foi como levar com uma barra de ferro na cabeça e acordar para uma dura realidade; a dura realidade de que eu não era nada sem ele, eu não sabia fazer nada sem ele… Desde 2013 para cá que ando à tona no oceano, a tentar perceber o que vou fazer da minha vida sem ele. Deixar de ama-lo fez com que a água me inundasse a garganta, sufocando-me e causando-me dor. Ele substituiu todas as ausências na minha vida. Alumiou-me na escuridão quando tudo o que eu possuía era um sentimento por ele.

 

Helena: É verdade que só começaste a chorar pelo teu pai quando deixaste de ama-lo?

 

Vanessa: Sim, é verdade! O Tiago fez esquecer-me, durante anos a fio, períodos de negligência e desentendimentos familiares. Com ele na minha cabeça, não havia dor que me golpeasse o coração ou gládio que me atingisse; eu era tão forte, desembaraçada e determinada. Eu teria sido capaz de mover mundos por aquele amor. Apenas o amor possui a capacidade de me vergar e quebrar o meu orgulho. Eu nasci para amar. Para devotar a minha vida ao amor, eu sinto isso, conheço-me, sei as forças que o meu amor pelo Tiago me proporcionou e também sei a quão fraca, patética, vulnerável e ridícula me tornei desde que o deixei de amar. Tampouco me reconheço (suspira).

 

Helena: É verdade que as pessoas dizem que tu és uma revoltada?

 

Vanessa: As pessoas dizem aquilo que deduzem. A maior parte delas contempla-me como um saco de lixo miserável e ensanguentado; filha de uma prostituta, desprezada pela própria família. Que importa ter sido criada em berço de ouro se acabei na imundice da vida, rodeada de pessoas que me odeiam? Que importa ter vivido toda a minha adolescência numa família burguesinha que ostentava como cunho de marca o toque da luxúria se tudo foi aglutinado por um imenso maremoto? Que importa que eu tenha lutado para construir uma carreira, para sobreviver e criar a minha autonomia se acabo sempre como a vilã da trama? Quando me olho ao espelho, contemplo cuidadosamente as minhas feições, de modo a esboçar um sorriso porque orgulho-me da minha insensibilidade e frieza para enfrentar determinadas intempéries que me acontecem na vida. Eu posso não saber mais quem eu sou desde que deixei de gostar do Tiago e ter perdido até a minha força, mas a insensibilidade e o sangue frio para aguentar chicotadas no corpo, marcas de guerra na minha pele, essa eu não a perdi. Após me terem vergado e flagelado o meu corpo, eu nunca derramo lágrimas: eu aguento! Eu lavo a face e coloco o maxilar no lugar, estico os músculos e massajo-os, as nódoas negras passam, a minha alma enrijece-se. O Tiago conseguiu partir-me o coração, mas nenhum outro mais conseguiu infligir, em mim, qualquer dor que fosse – física ou emocional! E se, porventura, o fizeram foi uma tempestade passageira, apenas umas brumas que estiveram de passagem. Ao fim de uns três ou quatro meses eu renascia para a vida outra vez e nunca mais voltava a abrir as gavetas daquele passado: os telemóveis eram apagados, as redes cibernautas bloqueadas; apenas ficavam as boas recordações – eu sou assim!

 

Helena: E o Tiago, porquê o Tiago?

 

Vanessa: A linha da minha vida é arenosa e está sempre húmida, parece um troço de estrada em terra batida, sem qualquer vegetação abundante, e um lamaçal em seu redor. O Tiago apareceu na minha vida no meio de um pedido de divórcio parental, irrompeu porta adentro – ainda que inconscientemente – no seio de uma família que parecia ser uma praticante beligerante da arte da guerra entre quatro paredes; a arte da comunicação não era, definitivamente, o dom das pessoas que me criaram. Empreendiam discussões e pedidos de divórcio que assassinavam por completo a tranquilidade que eu precisava para respirar. Bastou-me assistir ao primeiro pedido de divórcio para eu os qualificar de loucos. Fora criada pelos meus avôs paternos, onde a estabilidade era uma constante. Eu agarrei-me ao Tiago e aquilo que sentia por ele pois tudo na minha vida era uma imensa escuridão, estava escuro por todo o lado, como aqueles momentos sombrios que antecedem o alvorecer de um dia nublado. O Tiago foi a luz que calou o vento que uivava e o frio que me trespassava os ossos. Eu estava assustada. Depois de vê-lo, de falar com ele, de contemplar a sua face, toda a insegurança e medo desaparecerem. Dediquei-me única e exclusivamente a ele. Eu vivia no seio de um núcleo familiar onde a ausência de discernimento e claridade cegava toda a gente. Era como viver no meio de ervas daninhas; todos se acusavam mutuamente e, ao mesmo tempo, parece que todos apenas se importavam com as questões monetárias. Desde que o dinheiro chegasse a bom porto para sustentar os vícios fúteis e a vida de burguesas da ala feminina do casarão, qualquer intempérie, por mais duradoura que fosse, começou a ser encarada como um ato mundano. Chegaram a existir meses em que o silêncio era uma espada entre o casal, mas ambos pareciam já não se importar, fazendo as suas vidas individualmente, sorrindo, adaptando-se a ausência e “ curtindo “ a vida! Nos meus catorze anos de idade fui eu própria a poiar o pedido de divórcio efetuado pelo meu pai: ou viviam numa linha reta ou não, a escolha era deles! Todavia, o dinheiro falou sempre mais alto: pés-de-meia para o futuro das filhas, joias, roupas, comodidade, conforto. Devia ser difícil ceder ante um divórcio com tanta coisa em jogo, em cima da mesa…

 

Helena: É verdade que os divórcios mais in extremis coincidiram, por um acaso estranho do destino, com a presença do Ivo e do Tiago na tua vida?

 

Vanessa: Sim, é verdade! Eu passei o Verão todo de 1994 num campo de batalha, quer em casa, quer junto do Ivo e do Tiago. Não me era fácil conquistá-los. Estava a ser uma verdadeira quimera. Muitas das vezes apeteceu-me gritar: “ Hey, vocês precisam de saber uma coisa, a minha vida está um caos em casa, ok? O meu lar parece um barco fantasma e eu estou completamente sozinha nele: eu e o meu pai jantamos sozinhos juntos todas os serões, depois ele desaparece à noite para alguma reunião, ou outro sitio qualquer, a minha madrasta parece a maléfica desde que eu vim atrás de vocês: dardeja-me diariamente com ditos, bocas e indiretas, eu preciso de vocês, ok? Por favor, eu preciso da vossa amizade, independentemente do que vocês pensem de mim! “

 

Helena: Porque nunca lhes disseste isso?

 

Vanessa: Eles não tinham idade para compreendê-lo.

 

Helena: Achas que o Tiago lê este Blogue?

 

Vanessa: (desmancha-se a rir) Nem em sonhos, Helena! O homem tem mais com que se preocupar.

 

Helena: Dai o teu à vontade?

 

Vanessa: (ri-se) Evidentemente! Ser ignorada proporciona-me a certeza e paz absoluta que posso abrir o meu coração e sair ilesa, sem um único arranhão.

 

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 Vanessa possui uma personalidade que, por norma, assusta os demais: irreverência, audácia e ousadia são sempre as suas palavras de ordem. Aos dezasseis anos de idade teve  a coragem de declara-se ante a porta do Tiago, ainda que estivesse mergulhada em pânico, dois meses mais tarde compareceu no funeral do seu pai, ainda que soubesse, que era personna non grata. Aos vinte e quatro anos de idade escreve-lhe uma carta a desculpar-se por qualquer estupidez que tenha feito numa idade tão precoce quanto a adolescência. Aos vinte e cinco anos de idade termina um noivado de sete anos e é largada a sua porta em plena madrugada. Aos vinte e seis  anos de idade comparece no jogo da Taça de Portugal para ver Tiago a defrontar o Sporting, naquele que ela considera, um dos momentos mais emotivos da sua existência " Julguei que aquele fosse o unico jogo do Tiago que fosse assistir, alguma vez na vida. Estava nervosíssima. Tinha medo que me reconhecessem, embora o estádio nem permitisse tal coisa  " Aos vinte e sete anos de idade emagrece 15 kilos e tenta ganhar coragem para reconquistá-lo, mas, o medo, a timidez e o pavor de voltar a ser rejeitada leva a sua avante. Os outros homens galanteiam-na e colocam-na num pedestal, mas, nem toda a bajulação do mundo a faz conseguir aproximar-se de Tiago: " Morria de medo. A minha insegurança dominava-me por completo. Diziam-me para entrar em contacto com ele via as famosas redes cibernautas. Telefonavam-me quando o encontravam num bar ou num café e - por vezes - até me iam buscar a casa para me arrastar para junto do local onde ele se encontrava. Enviavam-me fotografias suas. A tudo eu dizia que não. Por muito que o desejasse, não conseguiria voltar a suportar a humilhação de ele me voltar as costas outra vez. " Aos trinta e quatro anos de idade ,comparece no término da carreira do Tiago enquanto futebolista, num jogo contra o Boavista, por um mero acaso do destino, a rapariga que não desejava ser reconhecida, acaba nas quatro linhas do campo, bem diante dele. " Tudo aquilo foi um mero acaso do destino. Quando me deram permissão para fotografar, nunca imaginei que fosse para junto do banco dos jogadores, ou para as extremidades do relvado. Acabei por ter livre-passe e aceder ao estádio uma hora antes que o público normal. Vi o treino de ambas as equipas antes de entrarem em jogo. Estava apavorada. Nem me podia esconder por detrás de uns óculos de sol. Liguei o MP4 e abstrai-me de tudo. Fiz o registo fotografico do jogo, com as pernas feita gelatina. Ali não houve hipóteses de me esconder, pois o Tiago reconheceu-me: eu estava bem diante dos seus olhos, debaixo do seu nariz! "  

 

A iniciativa de fazer um “ Verdade Ou Consequência “ revelou-se muito frutífera em termos de abordagem de narrativa e, como tal, decidimos repeti-lo, assim que nos fosse possível. Agradeço imenso a Vanessa a coragem de dar as respostas que deu e de se expressar com tanta honestidade acerca de alguns assuntos tão delicados.

 

Vanessa Paquete 2015 ©

Helena Coelho 2015 ©